Desde
que o desenho da Bruna sumiu do armário da Elvira, os ingressos para o
Corinthians x Juventus criaram pernas e desapareceram da maleta 007 do
professor Geraldo, enquanto o proprietário aproveitou o intervalo para ir ao
banheiro deixando a valise aos cuidados do seu Pereira, e uma pessoa não
autorizada que adentrou a escola “as barbas dos vigias”, indo parar na sala do
coordenador pedagógico, sem que este estivesse no recinto, o clima no colégio
Dom Pedro estava como a de um vulcão em plena atividade, a diretora andava nos
cascos e quando estava azeda; ai daquele que cruzasse o seu caminho. Não
bastasse o descompromisso do professor Manuel, agora tinha de conviver com um, “gatuno”
zanzando pelo ambiente de trabalho, e lidar com a incompetência dos responsáveis
em garantir “proteção” a todos, mas que não conseguiam impedir a um casal de
tartarugas de fazerem sexo se esse fosse o desejo dos pobres animais de casco
duro e olhar remelento. - Olha gente,
hoje ela tá com a macaca, parece que tinha espinho na cama, acho que o Valdemar
não tá dando conta do recado. Se eu
fosse vocês botava as barbas de molho. Foi esse o conselho que dona Lucicleide distribuiu
aos colegas depois de deixar a xicrinha fumacenta na sala da chefa. Ligeiro como ninguém, Paulão passou zíper na
boca e tratou de pentear o bigode de vassoura com pente fino longe dos olhos de
quem quer que fosse.
Na
hora que foi chamado a prestar depoimento na salinha azul, seu Pereira que era
quase cor de rosa ficou parecendo uma cereja: vermelhinho, vermelhinho. É bem
verdade que dos três episódios citados, só poderia ser responsabilizado por um,
mas como quem não tem sorte é azarado, deu a infelicidade de alguém gritar seu
nome justamente na hora que a chefa ia saindo da secretaria. Olhou para os lados,
assobiou para lá, assobiou para cá, coçou a cabeça prateada e com o lencinho
milagroso secou a testa suada, fingiu que não era consigo “de longe parecia um
elefante africano tentando esconder o traseiro gordo atrás de um pé de
bananeira”. Viu seu mundo cair quando a diretora o olhou com a cara de “se está
disfarçando é porque tem culpa no cartório”.
Para
o almoço de confraternização não convida, agora para me comer o toco... - Tô cansado de ser tratado desse jeito. - A
gente faz das tripas coração para deixar esta portaria como manda o figurino e ainda
tem de ouvir desaforos. - Pode esperar que têm troco! Se Deus quiser hei de
encontrar um político chapa quente que me arranje um cantinho na Regional para
eu descansar meu esqueleto, nem que para isso tenha que acampar na porta da
Câmara Municipal.
– Eu disse que a bicha estava azeda, não disse?
– E quem podia imaginar que o rabugento do coordenador ia gritar meu nome justo
na hora que a megera estava passando. Parece que o maldito fez de proposito! – Aquilo
não vale nada seu Pereira, é um baba ovo, isso é o que ele é. – Pode deixar! No
dia que tiver virado numa que "ronca e fuça" o galhudo me paga. – Essa eu quero
assistir de camarote, Pereirinha! – A senhora me aguarde! Bem fez seu Norberto
que deu o cano, e o Pé de Vento que tirou licença. – E onde foi parar seu Bene? Hoje não o vi
remexendo o traseiro murcho dentro daquela calça foló que não vê água há quinze
dias? – Ontem avisou que a mãezinha está adoentada. Vai pegar uns dias para
cuidar da velha. – Eita coisa boa! Agora eu vi tudo. – A senhora não viu nada,
amanhã mesmo irei ao hospital do servidor passar em consulta. Quem sabe Deus
abençoa, e consigo pegar uma licencinha de uns trinta e poucos dias.
Ultimamente estou sentindo um formigamento nos braços, uma fraqueza nas pernas,
uma leseira no corpo que só me da vontade de dormir. – Xiiiiii! Meu compadre começou assim. – E o que era? – Não sei? – Não acredito! – Pois é! O coitado morreu antes de dar
entrada no hospital. – Se dona
Lucicleide soubesse como estou não brincaria desse jeito. – Perdão seu Pereira
acabei me esquecendo da ensaboada, e o senhor também não me falou que estava no
bico do urubu. – É porque sofro calado! – Se está como diz, por que não foi ao
médico homem de Deus? – Não queria deixar a portaria “desprotegida”. Se adivinhasse
que ia levar uma espinafrada dessas, teria fingindo de morto e ficado em casa.
– É bom pra ficar esperto! A gente morre e a escola fica ai seu bobo. Eu quando
estou com meus problemas, não penso duas vezes. Já falei com a chefa, sábado é
aniversário do meu netinho e na sexta-feira vou dar umas pernadas lá pelas
bandas da 25 de Março. – Hoje! Foi hoje que a senhora falou com a bruaca? – Deus
que me defenda seu Pereira, do jeito que ela está ia me engolir viva. – Admirei
a senhora dizer que ia faltar na sexta. – Como vocês são bestas! Tem dia certo
para gente pedir essas coisas, seu Pereira. – Dia certo!? E que diabo de dia é
esse? Eu preciso saber, ultimamente só estou levando na tarraqueta. – Eu vou
contar, mas vê se não espalha. – Ô dona Lucicleide, pode ficar tranquila, juro por
tudo que é mais sagrado que da minha boca não sai um nadinha. –Vou confiar, mas
se abrir o bico vai me quebrar as pernas. – Fique sossegada, eu sou um tumulo. –
A primeira coisa a fazer é observar. – Observar o quê? – O senhor tem de prestar a atenção na hora
que ela chega. – O que quê tem? – Se chegar distribuído sorrisos, cantando feito
galinha caipira que acaba de botar o ovo atravessado, pode chegar junto, a danada
virou os olhinhos, Valdemar deu um suador na nela. Agora se aparecer com a cara
amarrada, sai de perto que vem chumbo grosso. E meu filho, quando a chefa chega
cantando, o senhor pode pedir até dinheiro que ela empresta. – A senhora tem
certeza? – Claro que tenho! Acha que conseguira dar meus perdidos, se não
soubesse dessas coisas? – Dona Lucicleide! – Vai por mim Pereirinha! Agora pare
de choramingar, com vinte anos de casa já devia conhecer a diretora com quem
trabalha. Sabe que a coitada anda nervosa mesmo é com o sumiço do professor Manuel.
– Ué! O macumbeiro desapareceu, e eu é quem pago pato? – Eu não disse homem de
Deus que no dia que a bicha chega azeda ela descasca o abacaxi no primeiro que
vê pela frente. É bom pro senhor ficar esperto, da próxima vez sebo nas canelas
– Olha dona Lucicleide tem vez que eu penso, não fosse à Marivalda uma chaminé
ambulante e por conta desse maldito cigarro até meus pulmões estão ficando
comprometidos, e do malandro do seu irmão que vivi a me perturbar, “ora pedindo
uma coisa, ora querendo outra”. Eu já
contei para a senhora do dia que o sovina levou a mulher e a renca filhos para
almoçar lá em casa, e quando a Marivalda pediu para que levasse o refrigerante,
o miserável apareceu com uma latinha de Coca de 350 ml, que mal dava para matar
a própria sede? – Umas vinte vezes! E também do franguinho garnizé que o
avarento levou para ceia de Natal, o bichinho era tão miudinho que mais parecia
uma codorninha esgarçada. – Essa eu tô careca de saber – Pois é, se não tivesse
esses inconvenientes pediria a contagem de tempo hoje mesmo. A senhora acha que
na minha idade sou obrigado a ouvir desaforos? – Claro que não seu Pereira, mas
se depois de tudo que falei continuar insistido nessa conversa vou achar que ao
invés de bronca, o senhor merece é uma surra com vara de sabugueiro. E tem mais,
entre morrer de câncer em casa e morrer de raiva aqui, é melhor ficar na
escola, pelo menos está ganhando seu dinheirinho. O senhor sabe que depois que
a gente aposenta o salário cai pela metade, não sabe? Já pensou! Quando seu
cunhado descobrir que está atoa. Não vai sair da sua porta pedindo um dentinho
de alho, duas colheres de café, um copinho de açúcar, uma pitadinha de sal.... –
Deus que me defenda. É capaz de eu largar minha patroa. – Então vai por mim,
logo-logo a raiva passa e tudo volta a ser o que sempre foi. Agora me de
licença. Vou dar no pé antes que a dona encrenca me veja.
Com essas palavras, dona Lucicleide pôs fim ao assunto e partiu pisando firme para o quartinho da bagunça arrumar sabe-se lá o que.
Com essas palavras, dona Lucicleide pôs fim ao assunto e partiu pisando firme para o quartinho da bagunça arrumar sabe-se lá o que.